quarta-feira, 27 de abril de 2011

The Crisis of Science - Edmund Husserl

"It was not always the case that science understood its demand for rigorously grounded truth in the sense of the sort of objectivity which dominantes our positive sciences in respect to method and which, having its effect far beyond the sciences themselves, is the basis for the support and widespread acceptance of a philosophical and ideological positivism. The specifically human questions were not always banned from the realm of science; their intrinsic relationship to all sciences - even those of which man is not the subject matter, such as the natural sciences - was not left unconsidered. As long as this has not yet happened, science could claim significance - indeed, as we know, the major role - in the completely new shaping of European humanity which began with the Renaissance. Why science lost this leadership, why there occurred an essential change, a positivistic restriction of the idea of science - to understand this, according to its deeper motives, is of great importance for the purpose of these lectures".

The Crisis of European Sciences and Transcendental Phenomenology - E. Husserl    

sábado, 23 de abril de 2011

Linguagem - M. Foucault

"Essa nova disposição implica o aparecimento de um novo problema até então desconhecido: com efeito, perguntava-se como reconhecer que um signo designasse realmente aquilo que ele significava; a partir do século XVII, perguntar-se-á como um signo pode estar ligado àquilo que ele significa. Questão à qual a Idade Clássica responderá pela análise da representação; e à qual o pensamento moderno responderá pela análise do sentido e da significação. Mas, por isso mesmo, a linguagem não será nada mais que um caso particular da representação (para os clássicos) ou da significação (para nós). A profunda interdependência da linguagem e do mundo se acha desfeita. O primado da escrita está suspenso. Desaparece então essa camada uniforme onde se entrecruzavam indefinidamente o visto e o lido, o visível e o enunciável. As coisas e as palavras vão separar-se. O olho será destinado a ver e somente a ver; o ouvido somente a ouvir. O discurso terá realmente por tarefa dizer o que é, mas não será nada mais que o que ele diz".

As Palavras e as Coisas - M. Foucault 
Imagem - Las Meninas - Diego Velásquez  

terça-feira, 19 de abril de 2011

19 de Abril: Dia do Índio

Um feriado ou data comemorativa é o dia do ano que foi eleito para marcar a importância de se valorizar uma determinada classe de pessoas, podendo, por exemplo, servir como referência para mobilizações políticas de caráter nacional ou até mesmo internacional. Trata-se de um marco político, um dia que reservamos para concentrar ou intensificar as mobilizações políticas. É claro que essas ações pontuais devem ser acompanhadas de um engajamento contínuo durante o restante do ano.

O dia 19 de abril, desde a década de 1940, foi definido por decreto presidencial como a data oficial de comemoração e valorização das culturas e sociedades indígenas. Desde então, nessa data, são desenvolvidas diversas atividades comemorativas e mobilizações políticas para demarcar a importância de se valorizar e respeitar os direitos humanos, políticos, culturais e sociais dos índios. A escolha desse dia se deu devido a um evento histórico de grande importância para os índios latino-americanos: no dia 19 de abril de 1940 foi realizado, no México, o Congresso Indigenista Interamericano, considerado o primeiro evento político mundial que contou com a participação efetiva de representantes políticos das sociedades indígenas. Desde então, teve início um intenso debate em torno do reconhecimento dos direitos políticos e humanos dos povos indígenas na América Latina e em outras regiões do mundo.

Hoje em dia são mais de 225 etnias que vivem no Brasil, contando uma população de  mais de 740 mil pessoas. Conforme dados do IBGE, a população indígena tem aumentado significativamente nos últimos anos. Da mesma forma, muitos povos possuem suas terras reconhecidas pelo Estado, onde possuem certa autonomia para exercer sua vida comunitária e contam com apoio do governo e outras instituições para desenvolver projetos que possibilitem a sustentabilidade econômica, cultural e ambiental dos seus territórios.

Muito se tem avançado na luta política em torno dos direitos culturais dos índios. São inúmeras iniciativas no Brasil inteiro, envolvendo centros de valorização da cultura, projetos de desenvolvimento sustentável e outras tantas iniciativas que têm dado bons resultados. Também já são muitos os índios que estão traçando seu próprio caminho na Universidade, profissionalizando seus membros mais jovens, que passam a usar os conhecimentos adquiridos para apoiar as reivindicações políticas de suas comunidades. É cada vez maior o número de índios cursando o ensino superior nas mais diversas áreas: direito, pedagogia, antropologia, etc. Da mesma forma, existe um movimento muito forte no Brasil na área de educação indígena, onde se tem buscado efetivar um programa educacional mais adequado às necessidades específicas desses povos: o ensino bilíngüe (em português e na língua nativa), assim como outros recursos pedagógicos apropriados para lidar com situações de diversidade cultural, social e política. 


Um bom exemplo é o movimento de educação indígena no Alto Rio Negro, com a instalação de escolas indígenas coordenadas e administradas pelos próprios índios, que discutem inclusive o conteúdo pedagógico que deve ser ensinado em sala de aula. Como parte desse processo, os povos indígenas dessa região têm buscado aliar atividades de ensino e pesquisa, envolvendo jovens indígenas em oficinas de capacitação em técnicas de pesquisa e desenvolvendo projetos na área de resgate e revitalização cultural. Iniciativas semelhantes existem em todo Brasil.

Por outro lado, ainda resta muito a avançar! Principalmente, na área de reconhecimento dos direitos humanos dos povos indígenas. Infelizmente, ainda existe muito preconceito em diversos setores da sociedade. Basta lembrar as reportagens preconceituosas publicadas recentemente em revistas de circulação nacional como a Veja, ou o noticiário nos grandes meios de comunicação, geralmente contrário aos interesses políticos dos povos indígenas. 


A disputa em torno da construção da hidroelétrica Belo Monte é um exemplo claro de que ainda temos muito que avançar no reconhecimento jurídico e institucional dos direitos humanos dos índios. Afinal, os procedimentos de consentimento prévio e informado das populações locais – preceito institucional acordado pelo Brasil com a Organização Internacional do Trabalho (Convenção 169) – não foram executados da maneira adequada. O fato é que o governo federal tem “atropelado” os procedimentos constitucionais para fazer valer os interesses dos grupos econômicos que irão lucrar com a obra. 


Outras tantas situações de desrespeito aos direitos humanos indígenas ocorrem diariamente em todo país. Talvez a situação do povo Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul seja o caso mais emblemático, pois explicita o conflito territorial dessas populações com fazendeiros e grileiros, ao mesmo tempo em que evidencia o etnocentrismo da nossa sociedade e o quanto ainda temos que avançar.

Reproduzo abaixo as palavras de três importantes lideranças indígenas, com a esperança de que a luta dos índios no Brasil avance bastante nos próximos anos. 

“Nossos antigos, quando viviam ainda sós na floresta, eram realmente sábios. Eles preferiam os dizeres dos cantos dos espíritos xaripë a qualquer outro pensamento. Mas hoje os brancos se aproximaram da nossa terra. AS palavras deles criaram obstáculos à voz dos antigos. Assim, as palavras dos xaripë esmoreceram no pensamento dos jovens. Hoje, eu receio que eles estejam se preocupando demais com as coisas dos brancos. Alguns ficam assustados pelo poder da yãkoana e, as vezes, recusam de se tornar xamãs. Eles têm medo de ver os espíritos e temem sua hostilidade. Então, eu me esforço por incentivá-los: ‘Não sejam medrosos! Daqui a pouco vocês terão esposas e seus filhos nascerão. Sem xaripë como poderão cuidar deles? Tornem-se Xamãs! Se vocês se comportarem bem, os xaripë virão até vocês. Eles são magníficos e poderosos!” Assim, me empenho em lhes dar os espíritos, pois, sem eles, os jovens se tornarão homens de pensamento obstruído” – Davi Kopenawa Yanomami

“Nós temos que nos orientar pelo rio. Está no rio o problema, e o problema está em cima, se você está embaixo de uma árvore, tudo que vem de sujeira, folha, vai cair em cima de você, em cima da sua cabeça. Assim está o problema das fronteiras. O problema é de todos nós, principalmente de quem está na beira do rio Xingu, do rio Suiá, do rio Manito, do rio Arraia, do rio Kuluene. O branco, o caraíba, está maltratando esse rio Xingu. Todas as cabeceiras estão sendo desmatadas, estão botando muita coisa que a gente não gosta, tem muito boi cagando no rio e o pior, estão jogando muito veneno na água, que vem parar aqui” – Mairawê Kaiabi

“Muitas vezes o branco fala que tem que preservar a natureza, mas muitas vezes só fala e não faz. O Guarani ama a natureza em silêncio, através do conhecimento milenar. Aquele que fica distante da natureza se torna uma coisa dura, com coração de pedra. Por que a cidade muitas vezes traz bastante recursos, então diz que o progresso traz desenvolvimento, mas também traz destruição. Nosso futuro, nosso desenvolvimento, para os Guarani significa nosso conhecimento. Respeitar a natureza significa desenvolvimento. É diferente do branco. Eu já fico com receio quando fala desenvolvimento sustentável, desenvolvimento não sei o quê... Eu falaria na minha língua envolvimento”. – Timóteo Verá popyguá

Fonte dos Depoimentos: “Povos Indígenas no Brasil – 2001/2005” – Instituto Socioambiental. 
     

sábado, 16 de abril de 2011

Ontologia Política em Mol

“(…) an object that is hidden underneath the skin. An object that may be approached in various ways, that shows a variety of aspects, but that in the end is one. There it is, and suddenly is no longer seems to be a part of practice, but a referent in a pre-existing reality: overwhelmingly real. At such moments doubt is smothered and certainty is being manufactured. (…) In contrast with the universalistic dreams that haunt the academic philosophical tradition, the world we live in is not one: there are a lot of ways to live. They come with different ontologies and different ways of grading the good. They are political in that the differences between them are of irreducible kind. But they are not exclusive. And there is no we to stand outside or above them, able to master them or choose between them: we are implied. Action, like everything else, is enacted, too”.

The  Body Multiple: ontologies in medical practices - Annemarie Mol

sexta-feira, 15 de abril de 2011

A Invenção da Cultura - Roy Wagner

"(...) o antropólogo é obrigado a incluir a si mesmo e seu próprio modo de vida em seu objeto de estudo, e investigar a si mesmo. Mais precisamente, já que falamos do total de capacidades de uma pessoa como 'cultura', o antropólogo usa sua própria cultura para investigar outras, e para estudar a cultura em geral. (...) Em outras palavras, a idéia de cultura coloca o pesquisador em pé de igualdade com seus objetos de estudo: cada qual 'pertence a uma cultura'. Uma vez que toda cultura pode ser entendida como uma manifestação específica ou um caso do fenômeno humano, e uma vez que jamais se descobriu um método infalível para classificar culturas diferentes e ordená-las em seus tipos naturais, presumimos que cada cultura, como tal, é equivalente a qualquer outra. Essa pressuposição é denominada de relatividade cultural. Como sugere a repetição da raíz 'relativo', a compreensão de uma cultura envolve a relação entre duas variedades do fenômeno humano; ela visa a criação de uma relação intelectual entre elas, uma compreensão que inclua ambas. (...) Um antropólogo experiencia, de um modo ou de outro, seu objeto de estudo ; ele o faz através do universo de seus próprios significados, e então se vale dessa experiência carregada de significados para comunicar uma compreensão aos membros de própria cultura. (...) De fato, poderíamos dizer que um antropólogo 'inventa' a cultura que ele acredita estar estudando, que a relação - por constituir os seus próprios atos e experiências - é mais 'real' do que as coisas que ela 'relaciona'. No entanto, essa explicação somente se justifica se compreendemos a invenção como um processo que ocorre de forma objetiva, por meio de observação e apreendizado, e não como uma espécie de livre fantasia. Ao experienciar uma nova cultura, o pesquisador identifica novas potencialidades e possibilidades de se viver a vida, e pode efetivamente passar ele próprio por uma mudança de personalidade".

 A Invenção da Cultura - Roy Wagner 

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Enxurrada causa danos ao Centro dos Estudantes de Pós-Graduação em Antropologia da UnB

Neste último domingo caiu uma grande enxurrada em Brasília. Choveu muito num curto espaço de tempo. Acabou que quem levou a pior foram os estudantes da UnB. O andar subterrâneo do ICC ficou completamente destruído. Estimativas apontam que a Universidade precisará de R$ 20 milhões para se recuperar dos estragos ocasionados pela chuva. A rádio e a emissora de televisão foram seriamente atingidas, assim como vários anfiteatros e centros de pós-graduação, entre eles o de antropologia. 

Ontem fui buscar alguns livros que havia deixado na Katakumba, centro dos estudantes de pós-graduação do departamento de antropologia, localizado no subsolo. O impacto foi grande! Realmente muito triste ver um espaço como aquele completamente destruído. A força da água é realmente impressionante: livros, cadeiras, mesas e estantes destroçadas, muita sujeira por toda parte. Realmente lamentável! Vai dar o maior trabalho reconstruir tudo. Lamento por aqueles que perderam livros e documentos importantes... Espero que a reitoria ajude no processo de reconstrução.

A Katakumba já acolheu muitos antropólogos nas últimas décadas. Uma exceção em departamentos de antropologia brasileiros, o espaço fornecia uma estrutura mínima para que os estudantes que não podiam ou não queriam estudar em casa pudessem levar adiante os seus trabalhos. A maior parte das salas tinha computador, mesas e estantes. Havia também um salão de leitura (área de descanso e muita criatividade!) e uma pequena cozinha, onde os estudantes costumavam tomar café e trocar idéias.

Nos dois primeiros anos de doutorado, costumava ir quase todos os dias pra lá. Assim como outros tantos “estrangeiros”, o lugar funcionava como um ponto de encontro e um espaço de socialidade para os recém chegados em Brasília. Todos os estudantes, mesmo aqueles que não freqüentavam o espaço diariamente, já passaram em algum momento por lá pra trocar idéias com colegas ou participar de alguma atividade alternativa. Desde que retornei pra Brasília, em 2010, passei a trabalhar em casa por uma questão de comodidade. De qualquer forma, sou muito grato por ter contado com o apoio e a infra-estrutura do local, assim como outros tantos colegas que passaram por lá nas últimas décadas.       

Tudo bem que o ambiente sempre foi um tanto insalubre. Afinal, fica no subsolo, sem janelas, muito mofo e pouca circulação de ar. Mas as salas são bem amplas, apesar de não haver espaço para todos os estudantes. De qualquer forma, é um lugar que proporciona a troca de conhecimentos e impressões sobre o mundo e sobre a antropologia. Acho que a Universidade deveria valorizar mais esses espaços de convivência estudantil, que foram desaparecendo na mesma medida em que foram aparecendo os restaurantes, lojinhas e lanchonetes (olha o capitalismo aí)...

Na UFRGS, lembro que tivemos que ocupar um Centro de Convivência que havia sido transformado pela reitora em um restaurante. Acampamos no local durante dias, desenvolvendo uma série de atividades: teatro, shows e grupos de estudo. Com o tempo, a reitora se convenceu que o espaço deveria voltar ao controle dos estudantes, o que acabou acontecendo após um ou dois anos de manifestações e mobilizações. Com isso, os alunos dos cursos de humanas e ciências naturais ganharam um espaço para conviver e viver o espírito de uma comunidade acadêmica, o que certamente foi importante na formação de todos que passaram por lá.


Espero que a Katakumba seja reconstruída e continue servindo como um espaço de criatividade e intensa convivência estudantil! 

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Objectivity - Lorraine Daston & Peter Galison

"Scientific objectivity has a history. Objectivity has not always defined science. Nor is objectivity the same as truth or certainty, and it is younger than both. Objectivity preserves the artifact or variation that would have been erased in the name of truth; it scruples to filter out the noise that undermines certainty. To be objective is to spire to knowledge that bears no trace of the knower - knowledge unmarked by prejudice or skill, fantasy or judgment, wishing or striving. Objectivity is blind sight, seeing without inference, interpretation, or intelligence. Only in the mid-nineteenth century did scientist begin to yearn for this blind sight, the 'objective view' that embraces accedents and asymmetries (...). This book is about how and why objectivity emerged as a new way of studying nature, and of being a scientist".

Objectivity  - Daston & Galison
 

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Sorriso Negro - Ivone Lara

Fica aqui minha homenagem à Dona Ivone Lara e a todos os negros do Brasil! Acho que esta música traduz muito bem a beleza e a força do nosso povo!


quinta-feira, 7 de abril de 2011

Nota Pública sobre a manifestação do Itamaraty a respeito da decisão da OEA sobre Belo Monte

Itamaraty desconhece o procedimento do Sistema Interamericano de Direitos Humanos

1) O governo brasileiro não pode alegar que tomou conhecimento da decisão da OEA “com perplexidade”, pois antes de publicar sua determinação de Medidas Cautelares, a Comissão Interamericana solicitou informações ao governo brasileiro a respeito do processo de licenciamento da UHE Belo Monte, em respeito ao princípio do contraditório e do devido processo legal. Tanto é verdade que já sabia do procedimento na OEA, que o Estado brasileiro respondeu aos questionamentos da Comissão Interamericana em documento de 17 de março de 2011. Somente após ouvir os argumentos do Estado brasileiro e dos peticionários (comunidades Arara da Volta Grande, Juruna do Km 17, Arroz Cru e Ramal das Penas, representadas por Movimento Xingu Vivo Para Sempre - MXVPS, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira - COIAB, Prelazia do Xingu, Conselho Indigenista Missionário - CIMI, Sociedade Paraense de Direitos Humanos - SDDH, Justiça Global e Associação Interamericana de Defesa do Meio Ambiente) é que a OEA decidiu determinar a suspensão do licenciamento e o impedimento de execução material da obra.

2) Por sua vez, as organizações peticionárias é que apresentam enorme perplexidade ao constatar o flagrante desconhecimento do governo brasileiro e do corpo diplomático do Itamaraty a respeito do sistema interamericano, em geral, e do instrumento de medidas cautelares, em especial, previsto no artigo 25 do Regulamento da Convenção Americana. Diferente do que afirma equivocadamente o Itamaraty, a solicitação de medida cautelar trata-se de instrumento que não exige o esgotamento dos recursos jurídicos internos, basta comprovada gravidade e urgência.

3) “Absurdo” e “injustificável” tem sido todo o processo de licenciamento do empreendimento, que está eivado de irregularidades, como indicam as mais de 10 ações judiciais propostas pelo MPF. A demora do Estado brasileiro em solucionar inúmeras ilegalidades em conjunto com as graves violações das normas internacionais de direitos humanos, como a Convenção 169 da OIT e a Convenção Americana de Direitos Humanos, tornam legítima e necessária a decisão da OEA, para proteger a vida e a integridade pessoal das comunidades da Bacia do rio Xingu.

4) É lamentável o Brasil manifestar-se de forma tão arrogante em relação à decisão da CIDH/OEA. A nota nº142 revela um Brasil incapaz de lidar com decisões internacionais desfavoráveis. A posição do Brasil que classifica de “precipitadas e injustificáveis” as determinações da CIDH/OEA demonstra uma postura extremamente contraditória do Brasil, enquanto pretenso candidato ao Conselho de Segurança da ONU, quando reiteradamente afirma a necessidade de respeito e acatamento das decisões tomadas pelas Nações Unidas. Não é demais lembrar que o comportamento do Brasil em relação à OEA/CIDH contribui sobremaneira para o enfraquecimento do Sistema Regional de Proteção dos Direitos Humanos do qual é um dos mais antigos signatários e defensores. A manifestação do Ministério das Relações Exteriores (Brasil) indica, por um lado, o tratamento autoritário que sistematicamente tem sido adotado por este governo no caso de Belo Monte e, por outro, a ignorância ou desconhecimento do Itamaraty a respeito do sistema interamericano de direitos humanos.

Movimento Xingu Vivo Para Sempre (MXVPS) 
Sociedade Paraense de Direitos Humanos (SDDH) 
Justiça Global (JG) 
Conselho Indigenista Missionário (CIMI) 
Comitê Metropolitano do Movimento Xingu Vivo 
Instituto Amazônia Solidária e Sustentável (IAMAS)

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Nota da OEA sobre a UHE Belo Monte

A Organização dos Estados Americanos (OEA) - através da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) - sugeriu ao governo brasileiro a suspensão da licença de início das obras do Complexo Hidroelétrico de Belo Monte. A declaração da entidade foi em resposta à denúncia realizada pelo Movimento Xingu Vivo e mais 40 instituições mobilizadas em torno da defesa dos direitos dos povos diretamente impactados pela construção da usina. A Comissão também recomenda que o Governo Brasileiro realize o processo de “consulta prévia, livre e informada” das comunidades locais. Segue o trecho principal do documento:

“A CIDH solicita ao Governo de Vossa Excelência que suspenda imediatamente o processo de licenciamento da UHE Belo Monte e impeça a realização da obra até que sejam observadas as seguintes condições mínimas:

Cumprir a obrigação de realizar processos de consulta, de acordo com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e jurisprudência do sistema interamericano, no sentido de que a consulta seja prévia, livre, informada, de boa fé, culturalmente adequada, com o objetivo de chegar a um acordo, e com a observância dos demais requisitos anteriormente enunciados, em relação com cada uma das comunidades indígenas afetadas, as quais são beneficiárias das presentes medidas cautelares”

O governo respondeu à OEA através de um comunicado do Itamaraty, onde menciona - com "perplexidade" - que a obra foi autorizada pelo Congresso Nacional, que determinou a realização de todos os procedimentos de licenciamento ambiental e dos estudos antropológicos, “com a devida consulta às comunidades indígenas localizadas na área”. O documento também afirma que a FUNAI e o IBAMA ficaram responsáveis pela realização da “consulta”.

A suposta “perplexidade” do governo diante do comunicado da OEA não é justificável, já que as comunidades da região estão mobilizadas em torno da questão há muito tempo e já manifestaram seu posicionamento contrário à obra em diversas ocasiões. A presidência da república, no entanto, tem se negado a debater a questão, agindo de forma autoritária diante das demandas colocadas pelo Movimento Xingu Vivo e outros setores da sociedade civil organizada. Por outro lado, é de conhecimento público e notório que os procedimentos de licenciamento ambiental não foram realizados com o “rigor” anunciado na nota do Itamaraty, pois a Casa Civil, em 2009/10, então sob o comando direto de Dilma, fez de tudo para atropelar o processo, manipulando cargos de confiança em setores estratégicos da FUNAI e do IBAMA com o objetivo de “agilizar” os procedimentos de liberação da obra. Da mesma forma, o processo de consulta às comunidades locais não foi realizado de forma “livre e informada”. 

Além do mais, é importante notar que existe uma demanda pública de que o tema da nossa matriz energética seja debatido publicamente, levando em conta os diversos interesses envolvidos na questão. Essa demanda, no entanto, vem sendo ignorada pelo Governo, que continua reproduzindo a sua visão desenvolvimentista sobre o assunto. As justificativas para a realização da obra anunciadas pelo governo são todas de ordem econômica, sem levar em conta valores políticos, culturais, ambientais e sociais que envolvem ações governamentais de grande impacto na sociedade local. Sob a alegação de que a obra é viável do ponto de vista econômico, todos os demais interesses envolvidos na questão têm sido completamente ignorados.   

A nota foi anunciada na Mídia, que deu ênfase à resposta do governo brasileiro e minimizou as declarações da OEA. Os líderes da oposição (PSDB) e do governo (PT e partidos aliados) defenderam a realização da obra, mostrando consenso sobre a questão. Segundo eles, o que está em jogo em Belo Monte são os chamados “interesses nacionais” e a questão da “soberania nacional”.

É importante notar que tanto a esquerda como a direita é completamente obcecada com o discurso “nacionalista” – no estilo “segurança nacional” - implantada e disseminada nos anos de chumbo do Regime Militar. Um nacionalismo conservador, baseado em uma visão limitada do que é o Brasil e do que é a sociedade brasileira. Afinal, o interesse econômico das empresas que vão lucrar com a construção da obra e das indústrias que vão se beneficiar da energia elétrica não pode ser traduzido enquanto “interesse nacional”, pelo menos não sem um debate público sobre a questão. Afinal, a recente manifestação dos trabalhadores que estão atuando nas grandes obras do PAC sobre as péssimas condições às quais estão submetidos e os baixos salários que recebem revela que o tal "interesse nacional" nada mais é do que a reprodução de uma velha e conhecida prática da elite brasileira: transformar seus interesses privados em "interesses nacionais", mobilizando a opinião pública a seu favor. 

E o interesse das populações locais – índios e ribeirinhos que vivem do rio Xingu – não é “interesse nacional”? Apenas os empresários que vão lucrar com a obra ou com a energia que será gerada são “brasileiros”? Que visão de Brasil é esse que a nossa ilustre presidenta da república defende? Afinal, não é ela que tanto se diz defensora dos direitos humanos? Por que, então, desrespeitar os direitos humanos dessas populações? Afinal, o direito a desfrutar uma vida digna e a um meio ambiente saudável também é um direito humano que, neste caso, está sendo negado em detrimento dos interesses econômicos de certos setores da sociedade. Será que o “interesse” dos ribeirinhos e dos índios que vivem na região não é interesse nacional? Até quando vamos reproduzir essa visão colonial de uma nação que nega a existência e os interesses de seus próprios cidadãos? 


Mais uma vez, sob a alegação de que os nossos índios e ribeirinhos estão sendo manipulados por "forças estrangeiras", o direito desses populações são anulados por aqueles que se dizem seus defensores. O mais lamentável em tudo isso é o extremo autoritarismo do atual governo, que se nega a debater publicamente quais são, de fato, os interesses nacionais que estão em jogo na construção de Belo Monte. A unica coisa "surpreendente" nesse contexto (mas bastante previsível), é o alinhamento do PT e do PSDB na defesa de uma mentalidade desenvolvimentista que já se demonstrou extremamente prejudicial ao Brasil e aos brasileiros. 

terça-feira, 5 de abril de 2011

Ontologia Histórica & Anarco-racionalismo - Ian Hacking

"Será isso afinal algum tipo de epistemologia? Certamente não é epistemologia naquele sentido maculado que Richard Rorty atribui a essa palavra em Philosophy and the Mirror of Nature (1979) [A Filosofia e o Espelho da Natureza], seu famoso repto à filosofia analítica americana como um todo. Ele interpretou a epistemologia como sendo não a teoria do conhecimento, mas uma busca dos fundamentos do conhecimento. Daston e suas colegas não estão procurando por fundamentos. Na verdade, a própria noção de que o conhecimento tem fundamento - ou melhor, grupos sucessivos de noções como essas - poderia ser um tópico para o epistemologista histórico. (...) Daston e suas colegas não fazem epistemologia. Elas não propõem, não defendem, nem refutam teorias do conhecimento. Elas estudam conceitos epistemológicos como objetos que evoluem e sofrem mutação. Um nome mais verdadeiro para o que fazem seria 'metaepistemologia histórica'. (...) Minha ontologia histórica diz respeito a objetos, ou a seus efeitos, que não existem em qualquer forma reconhecível até que sejam objetos de estudos científicos".  

"1) Existem diferentes estilos de raciocínio. Muitos deles são discerníveis em nossa própria história. Eles surgem em pontos definidos e têm diferentes trajetórias de maturação. Alguns se extinguem, outros continuam a se fortalecer; 2) Proposições do tipo que necessariamente requerem raciocínio para serem substanciada têm positividade, são verdadeiras-ou-falsas, apenas em consequência dos estilos de raciocínio nos quais ocorrem; 3) Daí que muitas categorias de possibilidades do que pode ser verdadeiro ou falso dependem de eventos históricos, a saber, do desenvolvimento de certos estilos de raciocínio; 4) Pode-se então inferir que existem outras categorias de possibilidades além das que emergiram em nossa tradição; 5) Não podemos raciocinar para determinar se sistemas alternativos de raciocínio são melhores ou piores do que o nosso, porque as proposições sobre as quais raciocinamos obtêm seu sentido apenas do método de raciocínio empregado. As proposições não têm uma existência independente do modo de raciocinar para chegar a elas".

Ontologia Histórica - Ian Hacking        

sábado, 2 de abril de 2011

Being-in-the-world - Heidegger

Our method has already been assigned. The theme of our analytic is to be Being-in-the-world, and accordingly the very world itself; and these are to be considered within the horizon of average everydayness – the kind of Being which is closest to Dasein. We must make a study of everyday Being-in-the-world; with the phenomenal support which this gives us, something like the world must come into view. That world of everyday Dasein which is closest to it, is the environment. (…) We shall seek the worldhood of the environment (environmentality) by going through an ontological Interpretation of those entities within-the-enviroment which we encounter as closest to us”. 


“The Being of those entities which we encounter as closest to us can be exhibited phenomenologically if we take as our clue our everyday Being-in-the-world, which we also call our ‘dealings’ in the world and with entities within-the-world. Such dealings have already dispersed themselves into manifold ways of concern. The kind of dealing which is closest to us is as we have show, not a bare perceptual cognition, but rather that kind of concern which manipulates things and puts them to use; and this has its own kind of ‘knowledge’. The phenomenological question applies such concerns. (…) they are simply what gets used, what gets produced, and so forth. As entities so encountered, they become the preliminary theme for the purview of a ‘knowing’ which, as phenomenological, looks primarily towards Being, and which, in thus taking Being as its theme, takes these entities as its accompanying themes”.


Being and Time - Martin Heidegger 
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