segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Motorista Atropela Manifestantes em Porto Alegre

Nessa última sexta-feira, membros do coletivo de ciclista "Massa Crítica" foram brutalmente atropelados quando iniciavam passeata contra a poluição do meio ambiente. Ainda no início da manifestação teria ocorrido uma discussão entre o motorista e os ciclistas, quando o carro saiu atropelando todos que estavam a sua frente. É realmente lamentável que algo assim ainda ocorra nos dias de hoje, espero que a justiça consiga capturar o motorista do carro, que se encontra foragido. Certos indivíduos têm dificuldade de entender que vivemos em uma sociedade democrática, onde as pessoas possuem o direito de se manifestar politicamente em espaços públicos. Essas pessoas precisam rever seus conceitos de civilidade e apreender a conviver com a diferença política e cultural. Mais lamentável ainda foram as declarações do delegado responsável pela investigação do caso. Segundo ele, "houve uma ação e uma reação", referindo-se à discussão que antecedeu o atropelamento. Tudo bem, mas me parece óbvio que a "reação", neste caso, foi completamente descabida e de uma grande covardia. Afinal, o poder de destruição de um carro diante de um coletivo de bicicletas é muito maior. O delegado também mencionou o fato dos manifestantes não terem comunicado a Polícia Militar sobre a manifestação, para que a brigada pudesse garantir a segurança do evento. Tudo bem, correto, mas isso também não justifica uma ação de tamanha brutalidade. Por respeito às vítimas, tal declaração nunca deveria ter sido feita pela autoridade responsável pelas investigações e o mais correto seria afastar o delegado e dar-lhe uma medida disciplinar.

Segue abaixo um vídeo que registrou o evento, com depoimentos de pessoas que presenciaram essa lamentável cena de brutalidade e intolerância.


domingo, 27 de fevereiro de 2011

Justiça suspende canteiro de obras de Belo Monte

A justiça federal do Pará suspendeu a licença de instalação do canteiro de obras de Belo Monte nesta última sexta-feira (25). Com isso, as obras estão temporariamente suspensas. Uma vitória parcial, mas importante, pois fornece mais tempo para o debate público. Apesar do governo não dar o menor indicativo que está disposto a abrir um espaço para que os efeitos positivos e negativos associados à construção de Belo Monte sejam expostos e discutidos em um ambiente democrático. Atualmente, infelizmente, esse espaço não existe. A decisão da presidenta tem sido favorecer os setores alinhados com a visão do Ministro Edison Lobão, que tem a questão como resolvida. Enquanto isso, os povos indígenas e ribeirinhos da região vivem a triste expectativa de perder elementos importantes para a manutenção do seu meio de vida.    

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Ajude a dar Voz ao Oriente Médio

Por todo o Oriente Médio – Bahrein, Líbia, Iêmen e mais países, regimes autocráticos estão tentando esmagar a disseminação sem precedentes de protestos pacíficos, usando a brutalidade e bloqueando meios de comunicação. Estes países estão em uma encruzilhada entre a libertação e a violência – e a habilidade dos manifestantes conseguirem transmitir informações para o mundo poderá definir o resultado. 

A Avaaz está trabalhando para “furar o apagão anti-protesto” -- garantindo modems e telefones via satélite, filmadoras minúsculas, transmissores de rádio portáteis e provendo equipes especializadas nas ruas – para permitir que os ativistas transmitam vídeos ao vivo mesmo com a Internet e linhas telefônicas bloqueadas, garantindo que os olhos e solidariedade do mundo fortaleçam estes movimentos corajosos pela revolução social. 

O tempo disponível para entregarmos a ajuda está acabando, os regimes estão agindo rapidamente para bloquear as fronteiras e as conexões de Internet. Pequenas doações de 25.000 pessoas poderão financiar a tecnologia crucial e equipes de apoio onde a ajuda é mais necessária. Vamos contribuir para fortalecer aqueles que estão carregando o destino do Oriente Médio em suas mãos pacíficas -- doe agora: 

https://secure.avaaz.org/po/blackout_proof_the_protests_9/?vl 

As incríveis transmissões ao vivo da praça Tahrir no Cairo foram vitais para manter o apoio popular, ao expor a violência descarada do regime do Mubarak contra os manifestantes egípcios. Ao assistir aos protestos do mundo todo, centenas de milhares de nós assinamos a petição de solidariedade da Avaaz, que foi anunciada na rede de televisão Al Jazeera, mostrando aos egípcios que o mundo os apoiava. Hoje, líderes dos protestos no Egito dizem que o apoio mundial sobre a sua causa os ajudou a impedir que os momentos de violência se transformassem em tragédia. 

Quando a censura da Internet se agravou, a Avaaz e parceiros trabalharam para enviar equipamento de Internet via satélite para os organizadores lá. Agora, Bahrein está se desdobrando para implementar o seu próprio apagão da Internet e nós temos a chance de prover um apoio fundamental para impedir a censura. O equipamento de comunicação e equipes de apoio vão ajudar os organizadores fazerem transmissões locais para organizar os protestos, se comunicar com outros ativistas na região e prover informações para o mundo se houver um apagão. Assim eles poderão contrapor a propaganda do regime e proteger os manifestantes através da exposição na mídia. 

Se a mídia internacional for expulsa, os manifestantes poderão manter um canal direto e ao vivo de informações circulando pela Internet. Com os recursos captados, a Avaaz poderá despachar imediatamente os equipamentos e uma equipe especializada para o Oriente Médio. 

https://secure.avaaz.org/po/blackout_proof_the_protests_9/?vl

Há momentos na história que o impossível se torna inevitável. Assim como a dissolução da União Soviética pouco antes da sua queda, as mudanças varrendo o Oriente Médio eram inimagináveis apenas um mês atrás. Mas o poder da sociedade tem uma lógica própria. Enquanto muitos de nós nunca pisou no Oriente Médio, a esperança deste povo está entrelaçada com a nossa e ao redor do mundo. Em momentos como este, é inspirador saber que a nossa solidariedade, em forma de esperança e ação, pode ter um pequeno papel em uma transformação histórica.

Com determinação, 

Stephanie, David, Alice, Morgan, Ricken, Rewan, Maria Paz e toda a equipe Avaaz

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Conflito de Civilizações

Veja abaixo vídeo elaborado pelo Movimento Global Avaaz sobre o conflito no oriente médio. Precisamos acabar com o choque de civilizações! Venha colaborar com esse movimento, divulgue a idéia entre amigos, pressione seus governantes e acredite, a união faz a força!


"Comecei com a suposição de que o Oriente não é um fato inerte da natureza. Ele não está meramente ali, assim como o próprio Ocidente tampouco está apenas ali. Devemos levar a sério a grande observação de Vico de que os homens fazem a sua história, de que só podem conhecer o que eles mesmo fizeram, e estendê-la à geografia: como entidades geográficas e culturais - para não falar de entidades históricas -, tais lugares, regiões, setores geográficos, como o Oriente e o Ocidente, são criados pelo homem. Assim, tanto quanto o próprio Ocidente, o Oriente é uma idéia que tem uma história e uma tradição de pensamento, um imaginário e um vocabulário que lhe deram realidade e presença no e para o Ocidente. As duas entidades geográficas, portanto, sustentam e, em certa medida, refletem uma à outra".

Edward Said - Orientalismo: o Oriente como Invenção do Ocidente       

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O Pensamento Selvagem - Lévi-Strauss

"Como nas linguagens profissionais, a proliferação conceitual corresponde a uma atenção mais firme em relação às propriedades do real, a um interesse mais disperto para as distinções que aí possam ser introduzidas. Essa ânsia de conhecimento objetivo constitui um dos aspectos mais negligenciados do pensamento daqueles que chamamos 'primitivos'. Se ele é raramente dirigido para realidades do mesmo nível daquelas às quais a ciência moderna está ligada, implica diligência intelectuais e métodos de observação semelhantes. Nos dois casos, o universo é objeto de pensamento. (...) A extrema familiaridade com o meio biológico, a atenção apaixonada que lhe dedicam, os conhecimentos exatos ligados a ele freqüentemente impressionam os pesquisadores como indicadores de atitudes que diferenciam os indígenas de seus visitantes brancos. (...) De tais exemplos, que se poderiam retirar de todas as regiões do mundo, concluir-se-ia, de bom grado, que as espécies animais e vegetais não são conhecidas por que são úteis; elas são consideradas úteis ou interessantes porque são primeiro conhecidas. Pode-se objetar que uma tal ciência não deve absolutamente ser eficaz no plano prático. Mas, justamente, seu objetivo primeiro não é de ordem prática. Ela antes corresponde a exigências intelectuais ao invés de satisfazer às necessidades. (...) Ora, essa exigência de ordem constitui a base do pensamento que denominamos de primitivo, mas unicamente pelo fato de que constitui a base de todo pensamento, pois é sob o ângulo das propriedades comuns que chegamos mais facilmente às formas de pensamentos que no parecem muito estranhas".

Lévi-Strauss - O Pensamento Selvagem

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Conflito Político na Líbia

Na história, os eventos políticos são avaliados conforme o poder de disseminação de novos paradigmas para a ação humana, abrindo novas possibilidades de imagin-ação e transform-ação de sociedades e governos. As manifestações políticas no Egito estão servindo de inspiração para seus vizinhos. O grito oriental de indignação contra as injustiças históricas oriundas da exploração desigual das reservas de petróleo do capitalismo ocidental vai inaugurar um processo lento (mas contínuo) de reconfiguração política do oriente médio. Estamos assistindo à emergência de uma nova etapa na política internacional.

Segue abaixo um vídeo explicando o caso da Líbia, onde os protestos civis dos últimos dias já produziram cenas de terror e centenas de vítimas. A internet na região foi cortada e os jornalistas foram impedidos de noticiar os acontecimentos. Mesmo assim, o povo está mobilizado e decidido a tirar o ditador do poder. No entanto, diferente do seu vizinho egípcio, o ditador da Líbia não pretende deixar o poder e promete "lutar até o último homem", ao mesmo tempo em que busca conter os protestos com ameaças de uma eminente guerra civil.  

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Bateson - "Body-in-the-environment"


"We commonly think of the external 'physical world' as somehow separate from an internal 'mental world'. I believe that this division is based on the contrast in coding and transmission inside and outside the body. (...)In considering units of evolution, I argued that you have at each step to include the complete pathways outside the protoplasmic aggregate, be it DNA-in-the-cell, or cell-in-the-body, or body-in-the-environment. The hierarchic structure is not new. Formerly we talked about the breeding individual or the family line or the taxon, and so on. Now each step of the hierarchy is to be thought of as a system, instead of a chunk cut off and visualized as against the surrounding matrix. (...) It is the attempt to separate intellect from emotion that is monstrous - and dangerous - to attempt to separate the external mind from the internal. Or to separate mind from body".  

Gregory Bateson - Steps to an Ecology of Mind 

A Simbologia da Água entre os Povos Indígenas e Tradicionais

Final do Dia - Rio Xingu/PA

"A água é um dos elementos centrais da reprodução não somente material mas também simbólica dos povos indígenas e comunidades tradicionais. Ela está presente em inúmeros mitos de criação dessas populações, da qual as divindades separaram as terras firmes. Também aparece nos mitos criadores das próprias sociedades, muitas vezes como dádivas dos deuses aos antepassados. (...) Nas sociedades tradicionais a água é um bem da natureza, muitas vezes dádivas da divindade, responsável pela sua abundância ou pela sua escassez. Proveniente da natureza, a água é um bem de uso, em geral coletivo. Nas sociedades urbanas e modernas, a água doce é um bem, em grande parte, domesticado, controlado pela tecnologua (represas, estações de tratamento), um bem público cuja distribuição, em alguns países, pode ser apropriada de forma privada ou corporativista, tornando-se um bem de troca, ou uma mercadoria. (...) O uso da água tem dimensões conflitivas e políticas, afetando de forma distinta as sociedades urbano-industriais e as tradicionais. A construção de barragens e sistemas de irrigação são um exemplo típico de atividade geradora de conflitos, beneficiando em geral as primeiras e prejudicando as segundas. As barragens destinadas a abastecer as cidades com energia elétrica e água alteram os hábitos migratórios de peixes afetando negativamente as comunidades ribeirinhas que dependem da pesca. (...) Nas sociedades tradicionais a água, incluindo rios e lagos fazem parte de um território e um modo de vida, base de identidades específicas (ribeirinhos, quilombolas e etc.) ao passo que nas sociedades modernas a água, como bem de consumo, é desterritorializada, canalizada de outros lugares muitas vezes distantes, com os quais as populações urbanas tem pouco ou nenhum contato".

 Antonio Carlos Diegues - Água e Cultura nas Populações Tradicionais Brasileiras       


terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

T. Ingold - Phenomenology & Science

"From a phenomenological standpoint, by contrast, the world emerges with its properties alongside the emergence of the perceiver in person, against the background of involved activity. Since the person is a being-in-the-world, the coming-in-to-being of the person is part and parcel of the process of coming into-being of the world. (...) Yet the scientist, like everyone else, is a being-in-the-world, and scientific practice, as any other skilled activity, draws unselfconsciously upon the avaible. Thus even science, however detached and theoretical it may be, takes place against a background of involved activityin. (...) These relationships, and the sensibilities built up in the course of their unfolding, underwrite our capacities of judgement and skills of discrimination, and scientists - who are human too - depend on this capacities and skills as much as do the rest of us. That is why the sovereign perspective of abstract reason, upon which Western science lays its claim to authority, is practically unattaible: an intelligence that was completely detached from the conditions of life in the world could not think the thoughts it does".

T. Ingold - The Perception of the Environment: essays in livelihood, dwelling and skill      

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Heidegger - Descartes & Subjetividade

"He began by doubting everything, but this doubt finally did run into something that could no longer be doubted, for, inasmuch as the doubter doubts, he cannot doubt that he is present and must be present in order to doubt at all. As I doubt I must admit that 'I am'. The 'I', accordingly, is the indubitable. As the doubter, Descates forced man in to doubt in this way; he led them to think of them self, of their 'I'. Thus the 'I', human subjectivity, came to be declared the center of thought. From here originated the I-viewpoint of modern times and its subjectivism".

Martin Heidegger - Modern Science. Metaphysics, and Mathematics (1967)        

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Novidades na Biblioteca Antroposimétrica!

Novos Textos Foram disponibilizados na biblioteca antroposimétrica (acessar no link ao lado):

Indigenous Knowledge and western science: the possibility of dialogue - Bala e Joseph
Humains et non-humains: un bilan d'etape de la sociologie des collectifs - Barbier e Trepos
The fractal Geometry of Mandelbrot - Anthony Barcellos
The Politics of Technology - Marc Berg
Fractal Dimension of Landscapes - Burrough
Scince, Nationalism, and colonial contestation: hindu chemistry - Chakraborty
Sciences sociales et lutte nationale dans le territoires ocuupés palestiniens - V. Romani
Merton's Contribution to the sociology of science - Stephen Cole
The Fold - Deleuze e J. Strauss
The Image of Objectivity - L. Daston e P. Galison
How Inevitable are the Results of Successful Science? - Ian Hacking
Why "Bitter Cassava? Productivity of "Bitter" and "Sweet" Cassava in a Tukanian Indian Settlement in the Northwest Amazon - Wilson e Dufour
Os Cultivares de Mandioca na Área do Uaupés (Tukano) - J. Chernela
Phylogeography and the origin of Cassava: new insights from the northern rim of the Amazonian basin - Léotard et all.
Shamanism or Science? - Gottlieb e Borin
Os Tambores do Antropólogo: Antropologia Pós-Social e Etnografia - M. Goldman
Concrete Topographies - M. Strathern

Vitória do Povo Egípcio!

Parabéns ao povo egípcio por essa grande vitória popular! O povo, na rua, jamais será vencido!



Após semanas de mobilização popular e conflitos civis no Egito, finalmente, o presidente-ditador resolveu se retirar do cargo e nomear um comitê militar para conduzir eleições democráticas no país. Após décadas de ditadura, os egípcios podem imaginar, pela primeira vez, uma sociedade mais justa e livre.

Mas ainda resta muito a fazer. Primeiro, é preciso manter os militares sob rigorosa vigilância. Apesar das claras demonstrações de apoio ao movimento popular do exército egípcio, inclusive, negando-se a reprimir manifestações contrárias ao governo instituído, não podemos esquecer o vínculo existente entre os generais egípcios e o Pentágono. Assim, o povo precisa estar vigilante para o Tio Sam não assumir o controle da transição. Afinal, uma democracia imposta não é, de fato, uma democracia real. É preciso que o povo se organize e construa alternativas de governo, incluindo também as forças políticas vinculadas ao Islã. Será preciso organizar partidos políticos, canalizar a mobilização civil para a abertura de alternativas políticas reais e consistentes em uma futura eleição.

De qualquer forma, hoje é um dia de comemoração! A derrubada do presidente foi uma grande conquista dos egípcios, além de uma demonstração clara que a revolta civil pacífica e organizada pode ser uma alternativa para a construção de sociedades mais justas. Esse evento político nacional pode servir como referência para as sociedades de outros países da região também submetidas à arbitrariedade de ditadores, dando início a um processo virtuoso de reconfiguração da política regional. Viva o oriente!

Agora, a construção de um novo regime é o segundo passo, talvez o mais difícil. Muita força ao povo Egípcio! Viva ao povo nas ruas!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Força da Imaginação - Ivone Lara

Diante de todas as dificuldades, buscamos sempre a superação! E com muita imaginação, uma qualidade positiva do povo brasileiro.  Para todos que acreditam nesse poder de imaginar uma sociedade mais justa, democrática e sustentável, recomendo escutar pelo menos uma vez por semana o hino de todo brasileiro, materializado aqui na voz e na alma dessa que é a primeira-dama do bom samba do dia a dia. Quando tudo parecer impossível, quando as barreiras e imposições sugerem a impossibilidade de superá-las, acredite, com a força da imaginação, tudo é possível! Ou nas palavras da grande sambista: "Força da Imaginação, vai lá! Além dos pés e do chão, chega lá. O que a mão ainda não toca, coração um dia alcança. Força da Imaginação, vai lá!".

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Belo Monte e a Manipulação da Notícia pela Rede Globo

Nessa terça-feira, em Brasília, lideranças indígenas e ribeirinhas do “Movimento Xingu Vivo” fizeram uma manifestação política no Planalto Central contrária à construção da hidroelétrica Belo Monte. O evento foi noticiado nos meios de comunicação e, em especial, pelo Jornal Nacional (Rede Globo). A forma como a notícia foi editada revela claramente a confluência entre os interesses das empreiteiras e o posicionamento velado (mas eficaz) desta rede de televisão. Vejamos.

O evento político foi noticiado na última seção do telejornal. Antes disso, no entanto, ao final da seção anterior, os jornalistas noticiaram um “apagão” que ocorreu em São Paulo, ocasionado por um problema de “transmissão”. Apesar desse evento não ter qualquer relação com a notícia sobre a hidroelétrica, a mensagem sublimar tem início aí. É como se os jornalistas afirmassem: “olha como a energia é necessária em nossas vidas!”. Afinal, a matéria deu ênfase ao “caos” ocasionado pelo blackout.

O tema é retomado ao final do jornal. A notícia é curta e tem início com imagens retratando os manifestantes discursando em frente ao Senado. Um índio Kayapó devidamente ornamentado com suas pinturas de guerra, tendo ao seu lado a emblemática figura de Raoni, manifesta-se contrário à construção da hidroelétrica. Ao fundo, imagens dos manifestantes com bandeiras onde é possível ler apenas: “Não”. Devido à velocidade em que a imagem foi mostrada, não foi possível evidenciar o restante da frase, apenas que se tratava de um coletivo que diz “não” à construção da hidroelétrica. A menção direta à manifestação política acaba aí. Ficamos sem saber quem são essas pessoas que se deslocaram de ônibus durante horas para manifestar sua insatisfação. Índios de qual etnia? Estavam acompanhados por outros movimentos ou grupos? Há quanto tempo eles estão mobilizados? Não seria interessante entrevistar uma liderança do movimento para que ele pudesse expressar os objetivos da manifestação? Não, nada disso. A reportagem não pretende dar voz aos manifestantes e muito menos transmitir as suas razões políticas.

A segunda cena retorna para o estúdio. O apresentador menciona que a obra irá gerar energia suficiente para abastecer durante um mês inteiro uma cidade com 17 milhões de habitantes. A informação é noticiada de forma vaga e imprecisa. Afina, isso significa que a energia gerada pela hidroelétrica vai de fato abastecer uma grande cidade ou que a energia seria suficiente para abastecer uma cidade? Para onde vai, afinal, a energia que será gerada pela hidroelétrica? Essa informação não é revelada por um motivo bastante óbvio: a energia gerada vai abastecer fábricas e indústrias da grande São Paulo. Ou seja, a energia não vai abastecer nenhuma população urbana, mas grandes máquinas da indústria de metais pesados. Isso significa que a obra não vai beneficiar milhões de pessoas, mas apenas meia dúzia de empresários. Essa informação tão valiosa para que os telespectadores possam se posicionar frente ao fato político não é mencionada pelo telejornal. Devido à experiência dos jornalistas responsáveis pela edição, é evidente que a omissão da informação foi deliberada, i.e, por vontade política mesmo.

A terceira cena mostra uma entrevista com um suposto “representante” do movimento contrário à construção de Belo Monte. Apesar do seminário realizado no dia anterior, em Brasília (UnB), ter reunido inúmeros especialistas que estudam a questão há um bom tempo, nenhum deles foi procurado pelos jornalistas, que nem mesmo mencionaram a realização de tal evento. A pessoa selecionada para falar em nome do movimento tinha um forte sotaque estrangeiro, provavelmente, norte-americano. Nada contra os estrangeiros, muito menos contra aqueles que defendem os interesses do povo brasileiro. Mas é óbvio que a seleção de um estrangeiro para falar em nome dos índios atingidos pela barragem faz referência ao argumento de que os povos indígenas estão sendo manipulados por gente de fora que não está preocupada com os chamados “interesses nacionais”. A mensagem subliminar manipula um estereótipo extremamente presente nas classes médias urbanas: a de que os índios amazônicos estão sendo manipulados por ambientalistas estrangeiros. Apesar de existirem muitos ambientalistas estrangeiros engajados na defesa dos povos indígenas, eles certamente são uma minoria diante de todos os atores locais envolvidos na defesa do meio ambiente e da diversidade cultural. De qualquer forma, a relação entre o porta-voz e o coletivo de manifestantes não é explicitada.

Por último, o repórter entrevista um engenheiro da UnB que defende a construção de Belo Monte. Segundo esse sujeito, essa hidroelétrica – em comparação com outras obras do mesmo porte – representa o menor risco possível para o meio ambiente e para os povos localizados na região. Nenhum outro detalhe é mencionado. O enunciado foi apresentado através de uma “tabela comparativa”, onde os “impactos” de Belo Monte são comparados com os impactos ocasionados por outras hidroelétricas. Veja bem como a informação, em si, não nos diz nada. Afinal, qual foi o tamanho do impacto ambiental e social das outras obras? Essa informação é importante, pois sem ela não conseguimos avaliar a magnitude dos impactos de Belo Monte. Mas o dado, neste caso, não foi construído para esclarecer as condições de sua produção, mas para convencer e formar a opinião pública nacional.

A notícia também transmite a idéia de que a obra vem sendo discutida há mais de trinta anos, tendo passado por várias modificações. Isso dá a entender que existe um debate público sobre a questão, quando de fato não existe. Mais uma vez, as omissões de informações contextuais e históricas são significativas. Não ficamos sabendo nada sobre a polêmica que tem acompanhado a emissão das licenças pela FUNAI e pelo IBAMA ou até mesmo sobre o direito de consulta prévia das populações diretamente atingidas. Enfim, vários acontecimentos são deliberadamente omitidos do conhecimento público. Sinal claro de manipulação deliberada da notícia.

Nada é mencionado sobre o financiamento público da obra e não existe nenhuma discussão sobre a sua real viabilidade econômica. Também não ficamos sabendo quem são os empresários que estão recebendo para construir a obra ou até mesmo quantos trabalhadores serão mobilizados para a região. A notícia, portanto, se limita a apresentar a construção da hidroelétrica como um fato inevitável da modernização.

Infelizmente, enquanto tivermos que lidar com este tipo de manipulação dos fatos pela mídia, nunca vamos conseguir avançar em temas tão importantes para a vida em sociedade, como os direitos humanos e os valores democráticos. Depois os jornalistas dessa emissora enchem a boca para se referir à suposta boa qualidade do seu jornalismo. Até onde eu sei, o compromisso do bom jornalismo é relatar as diferentes versões do fato, possibilitando que o próprio telespectador se posicione politicamente. No entanto, não é isso que vemos ocorrer em grandes emissoras como a Globo. A manipulação das notícias é gritante e completamente contrária ao código de ética dos jornalistas. Depois, quando a sociedade e o governo mencionam a necessidade de termos algum instrumento de controle social da mídia, algo como um observatório social, os representantes dos grandes meios de comunicação acenam com o retorno da censura no Brasil. Existe uma grande diferença entre o controle exercido em uma democracia do que aquele exercido na ditadura. Colocar essas duas formas de controle social com se fossem a mesma coisa é manipular, mais uma vez, a opinião pública nacional. A função social exercida pela grande mídia é de extrema importância para a nossa sociedade, pois esses meios de comunicação exercem um poder de formação de opinião imenso. Por isso, para que esse poder não seja exercido indevidamente, precisamos instituir alguma forma de controle. Esse controle, no entanto, exerce uma função completamente diferente da censura, pois visa garantir os valores democráticos e o código de ética do bom jornalismo, o mesmo que foi varrido das edições dos grandes telejornais há muito tempo.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Breve Relato sobre o Seminário "Belo Monte e a Questão Indígena"

Foi realizado nesta segunda-feira (07/02) o seminário “A Hidroelétrica Belo Monte e a Questão Indígena”, que contou com a participação de lideranças e especialistas engajados no tema. O evento foi uma iniciativa da nova diretoria da ABA, da Fundação Darcy Ribeiro e do Instituto de Ciências Sociais (UnB).

Gostaria de iniciar esse breve relato parabenizando os organizadores do evento por tão valiosa iniciativa, pois a discussão desse tema é de extrema importância. Reunir, em um mesmo espaço, especialistas e representantes da população afetada pela obra é uma contribuição importante para o debate público em um momento que o tempo governamental vem impondo seu próprio ritmo sobre as temporalidades indígenas e comunitárias, literalmente “atropelando” suas demandas políticas. Afinal, a principal reivindicação dos povos indígenas e dos pequenos agricultores que serão atingidos por essa obra é que eles precisam de mais tempo para discutir e avaliar a questão. O seu direito de consulta deve ser respeitado. Nada melhor do que um seminário para discutir essa questão, dando legitimidade institucional às reivindicações dos “atingidos”. Ao promover um evento como esse, a nova diretoria da ABA parece apontar que pretende conduzir uma gestão mais engajada nos problemas socioambientais do nosso tempo e politicamente mais ativa, o que é extremamente bem vindo na atual conjuntura nacional em que vivemos.

Estavam presentes no evento cerca de 70 guerreiros kayapós, membros do “Movimento Xingu Vivo”, pequenos agricultores e ribeirinhos que vivem na região onde será construída a hidroelétrica, além de estudantes, pesquisadores e representantes da sociedade civil organizada. As manifestações contrárias à construção da hidroelétrica demonstraram claramente a indignação dos "atingidos" com o descaso do governo federal, que busca a todo custo deslegitimar os seus interesses. Vale observar, por exemplo, a indignação dos grandes chefes indígenas Raoni Metuktire e Megaron Txukarramãe, figuras históricas do Movimento Indígena brasileiro que lutam contra a construção dessa obra há mais de trinta anos. Também é importante notar a presença de outras lideranças importantes do “Movimento Xingu Vivo”, como Ozimar Juruna, Josinei Arara e Antonia Mello. Foi muito bom poder ouvir o que essas pessoas têm a dizer sobre a experiência histórica das populações diretamente afetadas pela hidroelétrica. Por ourtro lado, ouvir os especialistas também serviu para esclarecer os detalhes técnicos da obra. A discussão permitiu colocar lado a lado a perspectiva das populações atingidas e dos especialistas, fornecendo um quadro geral sobre a problemática.

Belo Monte é a expressão paradigmática de um contexto histórico marcado pela reprodução do desenvolvimentismo como paradigma governamental. Estamos diante de um caso “exemplar”, que pode ser abordado como a expressão mais contundente de outras tantas iniciativas semelhantes. Todos os participantes do seminário deixaram claro que não são contrários ao desenvolvimento, principalmente, quando realizado de forma democrática, voltado para os interesses da população, com distribuição de renda e respeito aos direitos humanos. Inclusive, é importante notar que mais da metade das obras do PAC são iniciativas necessárias, voltadas para atender carências de infra-estrutura da população de baixa renda. Por outro lado, não podemos dizer o mesmo em relação às hidroelétricas e outras obras do mesmo porte. A pressão do grande capital sobre o processo de amadurecimento e análise das condicionantes e dos riscos sociais e ambientais associados à construção de mega obras como Belo Monte tem resultado em iniciativas que não correspondem, de forma alguma, ao interesse da sociedade brasileira, muito menos das populações diretamente afetadas. Por outro lado, o governo não permite que a sociedade civil organizada discuta esses riscos e avalie se a obra é desejável ou não. A pressão política das grandes empreiteiras tem afetado sensivelmente a capacidade do governo em conduzir o processo de forma democrática e conforme as diretrizes constitucionais. A falta de sensibilidade da população urbana que vive nas grandes metrópoles com questões aparentemente tão distantes do seu cotidiano mais imediato acaba “isolando” politicamente as populações diretamente afetadas por essas obras. Apesar do apoio de antropólogos, advogados e ambientalista envolvidos com esse tema, os indígenas e ribeirinhos afetados pela obra não conseguem sensibilizar a opinião pública nacional sobre a importância de se preservar a sua cultura e o meio ambiente. Se julgarmos pela pouca presença de estudantes no evento (o auditório estava quase completamente ocupado pelos movimentos sociais), podemos deduzir que tal tema – apesar da sua gritante importância para a consolidação da cidadania e da democracia – não consegue afetar a consciência da população que não é diretamente atingida. A ausência de qualquer menção ao evento no noticiário dos grandes veículos de comunicação é uma demonstração clara que as demandas políticas desses setores não possuem qualquer respaldo na mídia nacional, pois a questão não dá audiência. Infelizmente, os telespectadores estão mais preocupados em discutir as baixarias de um programa de extremo mal gosto como o BBB do que avaliar os impactos das hidroelétricas. Mal sabem eles que boa parte dos problemas vivenciados no cotidiano das grandes metrópoles - alagamentos, criminalidade e pobreza - estão associados ao modelo desenvolvimentista que vem sendo implantado no Brasil há mais de 70 anos. É esse mesmo modelo de governamentalidade - excludente e anti-democrático - que vem servindo de referência para pensar a nossa matriz energética.

Tudo se repete novamente. Conforme já dizia Sérgio Buarque de Holanda: o maior problema do Brasil é que aqui, por circunstâncias históricas muito específicas, instalou-se uma elite colonial (depois nacional) que sempre governou o país com os olhos na Europa (hoje Estado Unidos). O resultado foi o pior possível: o povo brasileiro, de fato, nunca encontrou um contexto favorável para expressar sua forma de ver e estar no mundo. Os nossos governantes sempre olharam para o povo como uma “etapa” anacrônica (a ser superada) em um projeto de modernização da sociedade. Os índios e as populações tradicionais foram historicamente considerados um “atraso” nesse projeto de “branqueamento”. Até mesmo a noção de mistura esteve sempre voltada para o enfraquecimento de nossa herança indígena e negra em nome das “qualidades” dos nossos dominadores coloniais. O descaso da sociedade mais abrangente com a preservação do modo de vida indígena e tradicional é um reflexo de uma ideologia predominante não somente no governo, como na sociedade brasileira: a idéia de que os índios, os negros e nossos camponeses representam a expressão mais contundente do nosso “atraso” em relação ao projeto de modernização ocidental. O trabalho ideológico realizado pelos nossos meios de comunicação de massa reforça ainda mais essa idéia, pois acaba contribuindo para a disseminação de preconceitos históricos tão arraigados no imaginário da nossa sociedade.

Em nome de um “desenvolvimento a qualquer custo”, os nossos governantes estão prejudicando o modo de vida das pessoas que vivem no local onde a hidroelétrica será construída. Conforme foi comentado por uma liderança durante o evento, as comunidades existentes na região só foram ter acesso à energia elétrica recentemente, em 2007. Muitas outras ainda não possuem acesso à energia e não existe nenhum projeto para que isso ocorra. A energia produzida será consumida quase que inteiramente pelas metalúrgicas de São Paulo e irá contribuir para o enriquecimento das empreiteiras e dos empresários. Os próprios trabalhadores braçais que vão construir a obra vão ganhar mal e depois de alguns meses estarão novamente desempregados. Ao que parece, o governo está governando conforme os interesses de uma pequena parcela da população.

É de conhecimento público que o projeto de Belo Monte foi retomado durante o governo de FHC, quando as reformulações da idéia original foram pensadas e executadas, assim como a mudança do nome da obra, dando a entender que se tratava de algo novo. Percebo como uma falha grave do governo Lula que tal idéia “tucana” tenha sido reproduzida sem qualquer critica. O próprio Lula entrou em contradição gritante ao apoiar Belo Monte, pois quando ainda era candidato à presidência fez questão de mencionar em seu plano de governo ser completamente contrário à construção de grandes hidroelétricas. Nessa ocasião, comprometeu-se em buscar soluções alternativas para o problema dos “apagões”. Tudo isso foi deixado pra trás após a sua posse, pois os seus ministros de energia – começando por Dilma – aplicaram a cartilha tucana sem adicionar ou reformular nem mesmo uma única vírgula. Belo Monte é apenas o caso mais paradigmático dessa submissão do governo aos interesses econômicos dos setores mais desenvolvimentistas da nossa sociedade. Afinal, conforme foi mencionado por um dos palestrantes, as empreiteiras responsáveis pela construção da obra vão lucrar mais de R$ 60 bilhões nos próximos 20/30 anos, livre de impostos. O financiamento da hidroelétrica com dinheiro público está sendo feito com taxas de juros muito menor que as taxas cobradas da população em geral. Conforme as estimativas mais conservadoras, os gastos públicos com a hidroélétrica podem chegar a R$ 30 bilhões. Quem está pagando esta conta é a sociedade brasileira!

É muito triste que um governo “popular e democrático”, que em outras questões tem realizado grandes avanços, continue atualizando historicamente uma forma de governar que é completamente contrária aos direitos sociais e políticos de uma parcela importante da nossa sociedade. O Governo Federal não pode tratar os índios, ribeirinhos e pescadores como se eles fossem “crianças”: ora como um coletivo cooptado por brancos mal intencionados, ora como pessoas ignorantes ou egoístas, que não estão dispostos a “entender” a razão da obra. Com isso, cria-se a idéia de que as pessoas que estão lutando por seus interesses estariam sendo manipuladas. Isso permite que as suas reivindicações históricas sejam completamente desconsideradas, mesmo que para isso seja necessário passar por cima da Constituição Brasileira. A julgar pelo que foi discutido no seminário, os “atingidos” pela obra são pessoas que, apesar de não terem um entendimento técnico sobre o tema, sabem que a sua vida irá mudar radicalmente após a construção da hidroelétrica. Essas pessoas não estão mobilizadas em torno de conceitos abstratos como “desenvolvimento sustentável”, “biodiversidade”, ou “diversidade cultural”, mas estão lutando pela garantia de uma forma de vida que está cada vez mais ameaçada. O fato é que essa obra coloca em risco a sua forma de habitar o mundo. A confluência entre antropólogos e ambientalista em torno do movimento é apenas o resultado de um acordo pragmático em torno de um fenômeno percebido como uma ameaça tanto para os intelectuais engajados na defesa de valores ambientais e culturais, como pela população cuja forma de estar no mundo está em risco.

O evento também demonstrou claramente que já chegou o momento de revisarmos esse conceito de “energia limpa”. Como podemos considerar uma obra que gera efeitos tão nefastos no meio ambiente e na vida cultural, econômica e social das populações diretamente atingidas como “limpa”? De qualquer forma, não resta a menor dúvida que a sociedade brasileira precisa de tempo para discutir a nossa matriz energética, permitindo, com isso, a proposição de soluções de médio e longo prazo que estejam mais de acordo com os múltiplos interesses de uma sociedade verdadeiramente democrática.

O problema é que, da forma como a discussão vem sendo conduzida pelo governo federal, os interesses das elites econômicas estão sendo considerados em detrimento dos direitos constitucionais de uma parcela importante da nossa sociedade. Agir com espírito democrático, neste caso, consiste em abordar de forma simétrica todos os interesses envolvidos e buscar uma alternativa para resolver o impasse. Atropelar todos os grupos contrários a obra – conforme o governo vem fazendo - é de um autoritarismo cruel.

O único membro do governo federal presente na ocasião foi o secretário de articulação social de Dilma, que participou da mesa à tarde. A sua intervenção no evento foi inexpressiva. Não apresentou propostas e nem mesmo garantiu qualquer medida favorável. Mas disse que estava ali para “escutar” e “aprender”. Espero, sinceramente, que tenha escutado e anotado tudo que foi discutido no dia. Inclusive o sentimento de indignação que transpareceu na fala das pessoas diretamente atingidas por Belo Monte. Fica a esperança que transmita à Presidente Dilma as reivindicações apresentadas pelos movimentos sociais e que cumpra com sua promessa pessoal: a de representar, em outra instância decisória, os interesses que foram expostos ali.

A ausência da FUNAI e do IBAMA é lamentável, tendo em vista que foram esses órgãos que licenciaram o canteiro de obras da hidroelétrica, além de serem os responsáveis pela concessão da licença definitiva. O fato foi comentado pelas lideranças presentes, que lamentarem essa ausência em um momento tão estratégico para os povos afetados.

Todos nós sabemos que o governo não é uma entidade homogênea. Existe, certamente, uma luta política que perpassa também o dia a dia dos órgãos governamentais, o que é válido também no caso da FUNAI e do IBAMA. Tenho certeza que alguns dos seus funcionários gostariam muito de poder exercer a função pela qual são responsáveis, mas têm sido impedidos de executar suas tarefas pelos seus dirigentes, alinhados com o posicionamento autoritário do governo Dilma. De qualquer forma, seria fundamental que esses funcionários manifestassem publicamente esse problema, aliando-se às populações diretamente afetadas por essa obra. Lamentavelmente, isso não ocorreu. Resta saber se por impedimento imposto pelos presidentes desses órgãos ou pela atitude bélica de setores da FUNAI que ainda alimentam preconceitos jurássicos contra a academia. O fato é que não havia sequer um único funcionário presente na ocasião, nem mesmo na platéia. Perde-se, com isso, a oportunidade de somar esforços em um momento tão importante para a consolidação da democracia no Brasil.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Seminário - A Hidroelétrica Belo Monte e a Questão Indígena

A Associação Brasileira de Antropologia e a Universidade de Brasília, em parceria com o Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC) e a Fundação Darcy Ribeiro, realizarão o seminário “A Hidrelétrica de Belo Monte e a Questão Indígena”, no dia 7 de fevereiro de 2011, no auditório da reitoria da UnB. O evento reunirá especialistas, lideranças indígenas, movimentos sociais e autoridades para discutir os impactos e o processo de licenciamento de Belo Monte.

Planejada para ser instalada em uma das áreas de maior diversidade cultural e biológica do país, a hidrelétrica de Belo Monte, além de inundar uma área de mais de 600 km2, promoverá até 80% de redução da vazão de um trecho de mais de 100 km do rio, denominado Volta Grande do Rio Xingu, atrairá uma população estimada em 100 mil pessoas e causará o deslocamento compulsório de cerca de 40 mil. Nesta área, residem os Arara, os Juruna, os Xikrin e milhares de famílias ribeirinhas, indígenas e não-indígenas. Ainda no Médio Xingu e seus tributários, residem os Parakanã, os Asurini, os Kararaô, os Araweté, os Arara, os Xipaia e Kuruaia e centenas de famílias que habitam as Unidades de Conservação que conformam o corredor ecológico do Xingu (Resexs, APA, FLONA, ESEC, PARNA). Mais próximos das cabeceiras do rio, estão os Kayapó do Sul do Pará, os Metuktire, os diversos Povos do Parque Indígena do Xingu e grupos indígenas voluntariamente isolados, que transitam na fronteira dos Estados do Pará e Mato Grosso.

O Seminário discutirá a magnitude dos impactos da hidroelétrica e seu questionável processo de licenciamento, que repercutem diretamente sobre os direitos e o modo de vida tanto de Povos Indígenas que imemorialmente vivem nesta região, quanto de Povos Tradicionais – camponeses, pescadores e extrativistas – e de outros grupos locais que dependem simbólica, social e economicamente da floresta, do rio e de seus igarapés.

Estarão reunidos, entre outros, representantes dos Povos Indígenas (Cacique Raoni Metuktire, Megaron Txukarramãe, Yabuti Txukarramãe e Josinei Arara), dos movimentos sociais (Antônia Melo da Silva) e do Ministério Público Federal (a subprocuradora geral da República, Deborah Duprat), além dos antropólogos João Pacheco de Oliveira Filho (Museu Nacional), Gustavo Lins Ribeiro (UnB), Bela Feldman-Bianco (Unicamp), Sonia Magalhães (UFPA) e Andréa Zhouri (UFMG) para juntos debaterem matéria que tanto interessa à opinião pública nacional e internacional. Também foram convidados a ministra do Meio Ambiente e os presidentes da FUNAI e do IBAMA.

Fonte: Nota à Imprensa - Associação Brasileira de Antropologia (ABA)

PROGRAMAÇÃO

7 DE FEVEREIRO DE 2011

Abertura - 9:00 horas
Reitor da UnB, Presidente da ABA, Diretor do Instituto de Ciências Sociais da UnB

Sessão 1 - 9:30 às 12:30 horas
Perspectivas sobre Belo Monte: indígena, dos movimentos sociais e de especialistas

Coordenador: Prof. Stephen Baines (UnB)
Expositores: Raoni Metuktire
Megaron Txukarramãe,
Ozimar Juruna
Josinei Arara
Antonia Mello (Movimento Xingu Vivo)
Profa. Sônia Barbosa Magalhães – (ABA-UFPA)
Debatedor: Prof. João Pacheco de Oliveira Filho – (ABA-UFRJ)

12:30 às 14:30 horas – intervalo

Sessão 2 - 14:30 às 17:30 horas
Problemas e dilemas de um grande projeto amazônico em debate.

Coordenadora: Profa. Bela Feldman-Bianco (ABA)
Expositores: Profa. Andréa Zhouri – (ABA-UFMG)
Dra. Deborah Duprat – Subprocuradora Geral da República
Prof. Sérgio Sauer - UnB
Ministra do Meio Ambiente
Presidente do IBAMA
Presidente da FUNAI
Presidente da Subcomissão da Usina de Belo Monte do Senado Federal/CMABMONTE.
Debatedor: Prof. Gustavo Lins Ribeiro (UnB)
Local: Auditório da Reitoria da Universidade de Brasília

Para saber mais sobre a Hidroelétrica Belo Monte e a Questão Indígena:


Vídeo com depoimentos de lideranças indígenas de diversas etnias sobre a construção da hidroelétrica Belo Monte:


Vídeo com depoimento de especialistas do IBAMA sobre a construção da hidroelétrica Belo Monte:

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Sobre o Conflito no Egito

Os Estados Unidos já entraram em muitas guerras em nome da “democracia” e da “liberdade de expressão”. Eles se apresentam ao mundo como guardiães dos valores liberais e enchem a boca para apontar o arbítrio de ditaduras inimigas vigentes em países como Coréia do Sul, o ex-Iraque e a pequena ilha de Cuba.

Mas nem todos os ditadores são mal vistos. Afinal, conforme uma frase de um conhecido general norte-americano: “os nossos ditadores são sempre bem vindos no Pentágono”. Sim, “os ditadores” apadrinhados pelo “Tio Sam” podem tudo: matar, desrespeitar os direitos humanos, desenvolver bombas atômicas e manter um povo inteiro submetido ao terrorismo de Estado. Quando o assunto é “os nossos ditadores”, tudo é válido: roubar, matar, passar por cima dos direitos civis... A lista de “liberdades” que o governo dos Estados-Unidos concede aos seus ditadores pode ser infinita.

Já os “outros ditadores” – o chamado “eixo do mal” - esses devem ser perseguidos em nome da “democracia”. Mas não qualquer democracia: é preciso criar a opinião pública. Se os democratas forem muçulmanos, por exemplo, bem... Talvez a democracia não seja um bom negócio mesmo.

Em um artigo publicado por um jornalista norte-americano, ele comentava que o governo do seu país estava “indeciso”, pois não sabia se apoiava o seu colega ditador ou exigia do mesmo uma guinada em direção à democracia. Mas, como tudo na vida, havia um “porém”... O “problema” é que os únicos partidos políticos organizados existentes no Egito são muçulmanos... Bem, então, vejamos... Conclusão do renomado jornalista: é preciso criar um partido “realmente” democrata e conduzi-lo ao poder. Ironia do destino: será possível falar em democracia quando essa democracia é uma imposição? Mais grave ainda, será que a democracia pode ser forjada pelo governo de outro país? Será que a “vontade popular” pode ser fabricada? Afinal, se o governo é do povo, não caberia ao povo egípcio decidir qual partido político deve assumir o poder?

Da mesma forma, ditaduras sul-americanas foram apoiadas durante os anos de Guerra-Fria: Argentina, Brasil e Chile são exemplos históricos que não podem ser negligenciados. Durante os anos de chumbo, governos eleitos popularmente eram combatidos, enquanto ditadores fascistas eram mantidos no poder. Afinal, é de conhecimento público onde estava o porta-aviões da armada Ianque quando Jango e Brizola fugiram do país pela porta dos fundos. Nessa época, a democracia não era bem vinda! Não! Sob essas circunstâncias, era melhor manter ditaduras “amigas” do que arriscar dar voz ao povo.

Ao ver os egípcios nas ruas, lutando por liberdade e justiça social, lembrei dessas ironias da história e fiquei tentando imaginar qual seria a atitude de Obama caso ainda vivêssemos sob o clima mais do que pesado da guerra-fria. Acho que os seus soldadinhos de chumbo seriam mobilizados e o exército esmagaria com violência a tal democracia que eles tanto defendem.

Mesmo diante de um contexto bastante diferenciado, a hipocrisia norte-americana continua ativa. Onde estão os valores democráticos? Por que todo esse silêncio e esse marasmo? As declarações são sempre evasivas, reflexo de uma “indecisão” estratégica. Afinal, todos sabem que o “ditador”, neste caso, era amigo íntimo do Pentágono. Seus militares freqüentavam os cursos norte-americanos, tomavam cafezinho com seus colegas de farda. Enquanto isso... No Egito, o povo sofria com as maiores injustiças. Mas o que importa? Para os generais norte-americanos a democracia é uma palavra vazia mobilizada em momentos estratégicos, seja contra ou a favor do povo.

Só espero que os egípcios possam viver sua própria democracia e não uma democracia imposta pelo olhar vigilante do velho “Big Brother”!

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