domingo, 4 de julho de 2010

Reflexões Pós-Derrota contra a Holanda...

Na copa, como na vida, não podemos vencer sempre, pois a condição fundamental para a existência da alegria do vencedor é que haja sempre, ao seu lado, a tristeza de quem perde. Assim como o sol e a lua, o quente e o frio, e tantas outras oposições binárias, o significado da vitória está diretamente atrelado ao significado da derrota: um não existe sem o outro. Portanto, a sabedoria popular que o diga, na vida ou na copa, além de apostarmos sempre na vitória, de nos dedicarmos para vencer, precisamos também apreender a perder. Conforme um ditado familiar: o que dignifica um homem não é o que acontece com ele durante a sua trajetória de vida, mas é o que ele faz com o que acontece com ele. O valor humano está exatamente na forma como abordamos tanto a felicidade como a infelicidade, a vitória ou a tragédia. Todo aquele que já caiu sabe muito bem o sabor de se levantar novamente. Todo aquele que já viveu sabe que a vida é uma montanha russa e retira daí a óbvia conclusão que a felicidade é sempre momentânea e que a sabedoria consiste em apreender a viver com essa verdade universal: no jogo, como na vida, a vitória produz a derrota como um resultado inevitável. Por outro lado, para que tanto a vida como o jogo sejam emocionantes é preciso que exista certa alternância entre perdedor e vencedor, caso contrário, a dialética da existência perde toda a sua emoção.Conforme diz outro velho ditado popular: existe o dia da caça e o dia do caçador.

Mas, a verdade é que nós torcedores brasileiros gostamos de achar que a vitória é uma obrigação, mais do que isso, costumamos dizer que não basta vencer, exigimos dos jogadores um show. Por isso, inclusive, quando o Brasil ganha, não procuramos culpados no time derrotado, acreditamos que a vitória é sempre um efeito inevitável da nossa superioridade futebolística: quando o Brasil ganha é por que o Brasil foi melhor. Por outro lado, o problema nessa lógica é que a derrota brasileira é percebida sempre como o resultado da falha do técnico ou deste ou daquele jogador. Nunca achamos que a derrota da seleção foi ocasionada pela capacidade do time adversário em vencer a partida. Desta vez não poderia ser diferente, mal a nossa seleção foi eliminada e a mídia – sempre disposta a explorar ao máximo as nossas fraquezas morais – logo saiu em busca de um culpado pela derrota, alguém que pudesse ser crucificado em praça pública. Desta vez, foram duas as vítimas eleitas como "culpadas" pela eliminação da seleção da Copa do Mundo: o Dunga por uma questão de vingança da classe jornalística; o Felipe Melo pela sua falta de maturidade. E neste caso, os números e as projeções já não fazem nenhuma diferença: não importa como foi a trajetória de vitórias do Dunga na seleção, não importa se foi o Felipe Melo que deu o passe para o Robinho fazer o gol contra a Holanda. Eles precisam de um culpado para crucificar e, desta forma, exorcizar o mal da derrota. A verdade é que, infelizmente, pelo menos no futebol, ainda não apreendemos a conviver com a tragédia.

Mas, por outro lado, não podemos deixar de notar que esta Copa vem apontando para uma sensível mudança na cultura futebolística dos brasileiros, pois não foram poucos telespectadores que expressaram a sua discordância com o comportamento abutre da nossa mídia: basta ver os movimentos de “Cala a Boca” que invadiram a internet. Ao que parece, o povo já não está mais tolerando a atitude ditatorial dos meios de comunicação, que além de serem os nossos “olhos”, também querem comandar as nossas almas.

Diferentemente do que pregam por aí alguns jornalistas mal intencionados, não acredito que a derrota tenha sido o reflexo da atitude deste ou daquele jogador e muito menos do técnico. Foram diversos os fatores que levaram à eliminação. A principal razão é muito simples: a Holanda teve mais sorte nos momentos decisivos e jogou melhor no segundo tempo. Outro fator foi a condição física dos nossos principais jogadores. Kaká já chegou “em recuperação” e estava melhorando sensivelmente partida após partida, mas a verdade é que ele não estava na sua melhor forma. Havia, portanto, desde o início, essa falha “estrutural” na seleção: a ligação entre a defesa e o ataque estava prejudicada. Dunga procurou resolver esse problema de diversas formas. Durante a Copa do Mundo, ele apostou em Elano, que apresentou um excelente futebol até ficar lesionado. Contra o Chile foi a vez de Ramirez mostrar seu trabalho. Mas contra a Holanda nenhum desses dois jogadores estava disponível. Claro que, neste caso, também faltou opções no banco de reserva. Talvez se Dunga tivesse levado o Ronaldinho Gaúcho ou até mesmo o Ganso teríamos maiores possibilidades para reverter os 2X1 contra a Holanda. Mas, enfim, quem estava no comando achou que essa não era a melhor opção. A verdade é que Dunga optou por formar um “coletivo” e não um grupo composto pela simples soma de indivíduos. A sua entrevista na ocasião da última convocação deixou isso bem claro: para o nosso treinador a seleção é um patrimônio nacional e deve ser tratada com respeito. É claro que esse patriotismo nunca foi bem visto pela geração Cola-Cola e pela Mídia, que não possui nacionalidade nenhuma e cuja única preocupação é explorar ao máximo as sensações humanas, sejam elas de tristeza ou de felicidade. Para uma mídia que foi formatada durante os duros tempos de ditadura militar, a função social dos meios de comunicação é apenas um preceito constitucional que, como tantos outros da nossa “Constituição Cidadã”, deveria ser distorcido ao máximo sob a lógica do capitalismo a qualquer custo. Para esses jornalistas que se apressam em eleger os culpados pela derrota da seleção não existe parâmetro ético: tudo é válido! O que importa mesmo é vender a notícia!

Sobre a derrota contra a Holanda, só posso dizer que a Copa do Mundo é uma competição breve que se decide nos detalhes. O Brasil esteve muito melhor no primeiro tempo e poderia ter marcado, no mínimo, mais um gol, mas não conseguimos aproveitar as poucas oportunidades que tivemos, algumas delas por alguns centímetros de distância. Naqueles primeiros 45 minutos de jogo, todos nós, torcedores, passamos a acreditar que era possível ser hexacampeão! A seleção apresentou o seu melhor futebol durante a competição e, por alguns minutos, tudo parecia possível! Mas, infelizmente,o gol não saiu e o segundo tempo foi um total desastre. A Holanda voltou para o campo mais preparada, jogou bem, mostrou que estava decidida a não sair da competição. O fato é que os jogadores "laranjas" têm qualidade, sabem jogar sob pressão, além de possuírem excelentes atacantes e sorte nos momentos decisivos. A seleção, por outro lado, baixou demais a guarda logo no início do segundo tempo e acabou levando o gol de empate. Bom, aí começaram os problemas para o Brasil. Primeiro, os jogadores não tiveram a capacidade de jogar sob pressão. A Holanda, com a frieza comum aos europeus do norte, soube aproveitar a fraqueza emocional dos jogadores brasileiros e foi pra cima até fazer o segundo gol. Nesse momento, era a hora do Dunga agir, tentar fazer alguma coisa, colocar o Nilmar, sei lá, mexer no seu esquema tático, enfim, colocar em prática o seu plano “b”. Mas a reação do Dunga foi muito demorada, talvez por que ele estivesse horrorizado diante do que estava acontecendo, talvez por que ele estivesse preocupado com o seu futuro. Afinal, não podemos desvalorizar o horror que o crucificado sente ao ver o peso da cruz que terá que carregar. Diante do conflito aberto com a mídia, não fica difícil imaginarmos o filme que passou pela cabeça do Dunga durante os últimos 20 minutos de partida. Já o pecado de Felipe Melo foi muito menor. A culpa desse jogador foi o excesso de dedicação e a sua atitude precipitada e imatura colocou abaixo as poucas esperanças que ainda restavam à seleção. Mas, será que detalhes que ocorreram num universo de alguns minutos e num contexto de total pressão psicológica são suficientes para transformarmos esses dois personagens em culpados? Talvez para um povo tão cristão como o brasileiro seja difícil lidar com a tragédia e superar os momentos de perplexidade sem recorrer ao arquétipo do sacrifício: assim que a partida acabou, a mídia sensacionalista correu para apontar – como Judas fez com Jesus Cristo – a identidade do culpado.

Mas se a seleção é culpada por ficar entre os oito melhores times do mundo, o que resta às seleções da França e da Itália ou até mesmo dos países africanos que estavam sediando a copa? Melhor do que isso, o que restará à torcida da Argentina depois de uma histórica goleada da Alemanha? E o que restará aos pobres jogadores da Coréia do Norte ou da Nigéria? O campo de concentração? Quando é que vamos apreender que apesar da vitória ser um bem almejado por todos também existe certa "doçura" na derrota? Toda narrativa épica valoriza igualmente vencedor e perdedor e não poderia ser diferente numa Copa do Mundo... Mas, afinal, vivemos em tempos de capitalismo, onde aos vencedores cabe a glória e aos perdedores, as batatas!

Para finalizar, só posso dizer que sou Uruguai desde criançinha! Pois acho que será mais um desses infortúnios colonialistas se um time europeu vencer a primeira copa do continente africano. Torci muito para Gana ser finalista, mas diante da atual conjuntura, o tricampeonato Uruguaio me parece ser a única conclusão coerente para uma copa tão maluca como foi a Jabulani!

Um comentário:

Carlos Rosalvo disse...

É impressionante como o acaso e o fortuito DECIDEM uma partida de futebol.

Faço eco de suas palavras, assiti ao jogo DUAS VEZES, não duvido que a "superioridade" da Holanda NÃO EXISTIU, SENÃO PORQUE NÃO APLIARAM O RESULTADO, apos a expulsão do Felipe Melo.

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